Psicologa em Curitiba

Estresse causado pela quarentena intensifica violência doméstica

Entrevista fornecida e publicada pelo Portal Comunicare, publicado em 09/set/2020

Estudos apontam que casos de abuso doméstico se tornaram mais ocorrentes durante o isolamento social.

Por Helene Mendes, Leonardo Henrique e Paula Braga Goveia

O isolamento social no Brasil afetou diretamente o comportamento humano, acarretando o agravamento de violência e agressões domiciliares. As mulheres, confinadas em casa, são o principal foco desse tipo de consequência negativa causada pela quarentena.

A estudante de enfermagem Ana Clara Garcia Cola, relata sobre os abusos verbais e físicos sofridos no período atual. Ela diz que notou maior irritabilidade do parceiro por estar confinado, e que o mesmo apresentou surtos de estresse e impulsividade violenta. “Não consegui sair. Porém consegui identificar o abuso que sofria com as agressões físicas, surtando por nada, quebrando meu celular ou pegando uma faca para me ameaçar.” Ela revela, também, que sua família sabe dos acontecimentos e aconselha as mulheres vítimas que denunciem imediatamente. “Nos primeiros sinais peça ajuda”.

Em abril, quando a quarentena ultrapassava um mês, a quantidade de casos de violência contra a mulher cresceu em quase 40% em relação ao mesmo mês de 2019, segundo dados do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMDH).

Os casos também se destacam no estado do Paraná, onde ocorreu um aumento de 8,5% no 1o semestre de 2020. Já em Curitiba, no mesmo período, houve o crescimento de 1.56%, foi de 2.023 casos para 1.992 nos três primeiros meses do ano anterior.

Apesar do maior volume de denúncias, o aumento da violência doméstica desapareceu das estatísticas dos órgãos de segurança pública. A promotora Valéria Scarance, coordenadora do Núcleo de Gênero do Ministério Público do Estado de São Paulo, afirma que a redução do número de casos durante a quarentena pode ser um reflexo da dificuldade da vítima em fazer a denúncia, estando no mesmo ambiente do agressor em tempo integral.

“A queda que houve nos boletins de ocorrência e processos no período de pandemia não corresponde à realidade das agressões.”

Ela acredita que as vítimas estão com dificuldade de sair de casa para denunciar ou pedir ajuda. ‘‘As vítimas podem estar sofrendo a violência doméstica por mais tempo’’, afirma Valéria.

Buscando uma solução para esse problema, Juliana Emerique, delegada e diretora da Divisão de Polícia de Atendimento à Mulher (DPAM), contou que a Polícia Civil irá inaugurar um novo canal de atendimento para mulheres vítimas de agressão, através do Canal 197.

Ligando para o número, é possível fazer a denúncia de ocorrências anonimamente pelo telefone, sem sair de casa.

“A gente não quer que chegue na morte. Para que isso não aconteça, a gente tem nessa época de pandemia um serviço especializado no que tange às mulheres. É o número 197, que a pessoa pode fazer o registro pelo telefone. É uma inovação para essa época de pandemia.”

No Paraná, essa ferramenta se encontra virtualmente, onde há a possibilidade de se fazer o Boletim de Ocorrência (B.O) pela internet. Com exceção em casos de violência sexual, este serviço pode ser encontrado pelo site oficial da Polícia Civil, onde foi oficializado em 3 de junho deste ano.

O lado psíquico

A psicóloga especialista em terapia sistêmica Giovanna Borba, explica: “com o prolongamento do isolamento, a falta de interação foi afetando diretamente as pessoas, do ponto de vista emocional e até mental. Houve um aumento significativo dos níveis de ansiedade, estresse, tristeza, depressão, pensamentos e ideação suicida, entre outros sintomas.”

“Somos acostumados há milhões de anos a viver na coletividade, em comunidade, com trocas e interações sociais. Quando nos foi instituído o ‘isolamento social’, significou uma ruptura abrupta das relações que temos desde que nascemos.”

Ela também relaciona a ocorrência dos casos de abuso doméstico com problemas mentais intensificados pela falta de interação; “devido a pandemia, muitas pessoas têm procurado ajuda psicológica, pois houve aumento no nível de ansiedade e estresse ou até brigas no ambiente familiar. Por mais que vivemos em comunidade, também não estamos acostumados a ficar “presos” dentro de casa com as mesmas pessoas por cerca de 3 ou 4 meses”, afirma Giovanna.

O psicanalista André Tarques discorre: “vejo que o emocional de cada sujeito ficou comprometido, pois o isolamento fez com que as pessoas sintam falta uns dos outros. Seres humanos não nasceram para viverem sozinhos. Sabemos que o ser humano é capaz de se adequar e recriar quando necessário, e estamos vendo isso acontecer no dia a dia, o que é importante para sobrevivência, seja ela mental ou financeira.”

“Hoje, vejo que a humildade, empatia e solidariedade é a esperança para um mundo melhor. Tiraremos desta situação um belo aprendizado, olhando para um mundo soberano, maior que nós seres humanos.”

Tipos e sinais de violência contra mulher

A Lei Maria da Penha, sancionada há quase 14 anos, prevê cinco formas de violência: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral.

Sinais como comportamento controlador por parte do parceiro, frustração com expectativas irreais em relação à parceira, grosseria, atitudes exageradas, crueldade (com todos os residentes da casa) e hipersensibilidade (em que tudo ofende o parceiro) são traços de alerta.

Como denunciar

A Delegacia da Mulher continua funcionando normalmente, além disso sempre estão disponíveis para ligações emergenciais para o número de telefone 190.

Denúncias são recebidas pelos números 180 e 181.

Na capital paranaense, o telefone da Delegacia da Mulher é: (41) 3219-2600, além do site oficial da Polícia Civil, onde se pode fazer o boletim de ocorrência online.

Outros números para apoio nessa situação: (21) 23328249 (Disque Mulher), 127 (Ministério Público).

Outras formas de proteção são, se possível, avisar familiares e amigos de confiança sobre a situação, deixar os números de emergência anotados, planejar uma saída para um local seguro ou até um hospital se for o caso. Também é de interesse separar itens de emergência para o caso de ter que sair ou fugir rapidamente (chaves, documentos e dinheiro, por exemplo).

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